24 fevereiro, 2014

Maria Clara





                                                                                Maria Clara
     

       Faz um mês que estive numa consulta médica. Fui sem marcar horário, porque não estava me sentindo bem. Como sabia que iria ter que esperar levei um livro, não para ler, mas para não precisar conversar (não que eu não goste), mas porque este momento de minha vida, o bate-papo não seria espontâneo.

 Enquanto as pessoas que ali estavam liam revistas, falavam e teclava em seus celulares, eu fingia que lia o livro que estava em minhas mãos. Meus pensamentos estavam doloridos demais, tanto quanto meu corpo. Foi então que uma senhora entrou acompanhada de uma menina de touca azul, que cumprimentou a todos (poucos responderam). Ela sentou-se ao meu lado e se apresentou: – Oi, eu chamo Maria Clara e você? Respondi com meio sorriso. Ela perguntou se eu estava conseguindo entender o que estava lendo, pois o meu livro estava de ponta cabeça. Ri baixo e lhe disse que na verdade eu não estava tentando ler, apenas queria ficar “na minha”. Ela, sem mais nem menos, começou a me encher de perguntas.

A mãe da menina, que estava sentada do outro lado da sala, de vez em quando olhava em nossa direção e sorria, parecia triste, mas era uma mulher muito bonita, assim como Maria Clara.
    A secretária veio e nos disse que o médico realmente iria demorar a nos atender, pois estava cuidando de uma emergência, e nos alertou que, caso alguém quisesse remarcar para outro dia, podia acompanhá-la. Confesso que tive vontade, mas, por outro lado, já que eu estava ali, iria aguardar.

      Maria Clara perguntou se eu trabalhava, respondi que eu cuidava da minha casa. Ela falou inocentemente: – Cuidar da casa não é trabalho, é obrigação. Mas é bom, né? Porque ninguém cobra nada! (ela que pensa!).  Foi aí que ela me conquistou! Quando me dei conta estávamos conversando como amigas, embora nossa diferença de idade fosse grande, mas para ser/ter amigos basta existirmos.

Entre tantas perguntas que ela me fez, como qual a minha cor favorita, meu prato predileto, minha melhor amiga etc., ela me perguntou se eu sofria pela perda de alguém. Respondi que sim – do meu pai (nos difíceis momentos que tenho passado, sinto muito a falta dele. Ninguém saberia me abraçar como ele). Ela segurou minhas mãos e falou: – Quem a gente ama, nunca morre! Segurei minhas lágrimas e pensei que era bastante sabedoria para uma criança de sete anos. Contudo, pensando melhor, como alguém tão pequena poderia me dar lição de vida? Afinal, ela não sabia nada da vida, muito menos da minha. Para quebrar aquele momento estático, perguntei-lhe: – O que você quer ser quando crescer? Ela respondeu: – O mesmo que sou hoje – feliz! Todos que ali estavam nos olhavam com uma expectativa em mim. Eu lhe abracei como se abraçasse minha filha.

Maria Clara continuou me contando sobre ela: que tinha um irmão mais velho (que era adolescente) e que, ainda assim, era boa pessoa (resisti, mas não perguntei por que); que amava o Brian (seu cachorro, mesmo sendo velho); que amava desenhar nuvens (porque não precisava exatidão); sua cor preferida era o azul-céu; e que ela tinha o melhor pai e mãe de todo o mundo inteiro (exatamente com essas palavras), assim como você, porque os nossos são sempre os melhores, né?! Concordei com a cabeça e com o coração.

 

     O tempo que passei esperando ficou curto com a presença daquela menininha, que foi atendida antes de mim (eu tive que esperar mais meia hora). Quando ela e a mãe saíram do consultório, ela correu me abraçar disse: – Seja feliz! A mãe dela também me abraçou. Percebi que tremia e com a voz embargada me agradeceu (eu quem estava grata por ter conhecido Maria Clara). Senti vontade de pedir o telefone, mas não o fiz.

 

     Um mês depois, voltei ao médico para levar meus exames e, naquela mesma sala de espera (só que menos cheia, pois o médico estava no horário), pensei em Maria Clara. Decidi pedir à secretária o telefone. Com minha habitual educação, falei sobre aquele meu dia com Maria Clara, aquela adorável menina... A secretária não esperou eu terminar: – Ela morreu, sinto muito!

 

     Quando saí do consultório, olhei para o “azul-céu” com uma nuvem sem “exatidão”.  Chorei!








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2 comentários:

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